agravo de instrumento o que é 1.015 CPC

O agravo de instrumento representa uma das ferramentas recursais mais estratégicas do direito processual civil brasileiro. Compreender suas nuances, prazos e aplicabilidade no CPC pode determinar o sucesso ou fracasso de uma estratégia processual, seja em casos de direito civil puro ou mesmo em Direito de família. Como advogado, você pode se sentir caminhando na corda bamba, mas deve enfrentar o medo e dominar esse recurso. Esse artigo – espero! – é o primeiro passo para isso.

Este recurso permite contestar decisões interlocutórias que, embora não encerrem o processo, podem gerar consequências irreversíveis se não forem prontamente revisadas pelo tribunal competente.

1. O Que é Agravo de Instrumento no CPC: Conceito e Finalidade

O agravo de instrumento constitui o meio processual adequado para impugnação de decisões interlocutórias proferidas durante o curso do processo. Diferentemente da apelação, que contesta a sentença final, este recurso visa à reforma imediata de pronunciamentos judiciais que demandam correção urgente.

Trocando em miúdos, podemos dizer que a decisão interlocutória é aquela que é feita no decorrer do processo: um indeferimento de uma prova, a negativa de gratuidade da justiça, ou qualquer outra decisão relevante que não finalize o processo. Portanto, esse recurso não serve para sentenças, que são, por definição, terminatórias (o recurso, neste caso, seria a apelação).

Quem julga o agravo de instrumento não é o mesmo juiz, já que este recurso “sobe” para o Tribunal de Justiça. Ou seja, a decisão do juiz singular (de primeira instância), será reanalisada por um colegiado composto de três juízes de segundo grau (chamados desembargadores). Um deles será o relator – isto é, irá relatar o caso, escrevendo o que ocorreu, e pronunciar seu voto, fundamentando a decisão – e os demais irão votar na sessão de julgamento para dizer se concordam ou discordam dele. Se discordar, deve fundamentar a razão da discordância.

2. Natureza Jurídica e Importância Processual do Agravo de instrumento

Imagine que você deve dizer quais provas pretende produzir para demonstrar o direito do seu cliente, e conclui que é fundamental realizar um exame pericial, como, por exemplo, uma inspeção por engenheiro em uma construção para demonstrar que os danos no imóvel foram causados pelo réu.

Esta seria a única forma para provar que seu cliente tem razão, que sua casa está para cair porque o vizinho cometeu barbaridades ao fazer a fundação do edifício que ele está construindo. O que você faria se o juiz negasse esta perícia? A decisão dele não terminou o processo (ou seja, é interlocutória), portanto o recurso adequado seria o agravo de instrumento.

Apesar de não parecer uma decisão tão importante quanto a sentença, ela é fundamental, pois a desconsideração desta perícia fará com que seu cliente certamente seja derrotado no processo. Assim, no fim das contas, temos um instrumento importantíssimo nas mãos, pois ele pode vir a garantir que decisões potencialmente equivocadas não comprometam o resultado útil do processo.

3. Hipóteses de Cabimento: Artigo 1.015 CPC e Suas Interpretações

O artigo 1.015 do Código de Processo Civil estabelece rol taxativo das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. Essa sistemática, implementada pelo CPC/2015, visou reduzir a sobrecarga dos tribunais, restringindo significativamente as possibilidades recursais.

4. Principais Hipóteses Legais de Cabimento do Agravo de Instrumento

O primeiro passo deve ser sempre verificar o texto do artigo no Código de Processo Civil. Isto é o que dispõe o artigo 1.015 do CPC:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

I – tutelas provisórias;

II – mérito do processo;

III – rejeição da alegação de convenção de arbitragem;

IV – incidente de desconsideração da personalidade jurídica;

V – rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação;

VI – exibição ou posse de documento ou coisa;

VII – exclusão de litisconsorte;

VIII – rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio;

IX – admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;

X – concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução;

XI – redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º ;

XII – (VETADO);

XIII – outros casos expressamente referidos em lei.

Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

5. Tema 988 do STJ: A Flexibilização Jurisprudencial Necessária

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 988, promoveu significativa evolução interpretativa do artigo 1.015 CPC, reconhecendo que o rol do agravo de instrumento, embora taxativo, admite interpretação extensiva e aplicação analógica em situações específicas.

Como você pode observar, o nosso exemplo (prova inadmitida) não se encontra na lista do artigo 1.015 do CPC, mas graças às decisões reiteradas de nossos Tribunais, entende-se hoje em dia que há certas situações em que a falta de resolução pelo agravo seria contraproducente, já que ao invés de melhorar a situação do acúmulo de recursos, poderia atrapalhar e deixar de distribuir justiça. No nosso caso, alegaríamos cerceamento de defesa na hora da apelação, e tudo o que foi feito até lá poderia ser perdido, fazendo com que o processo tivesse uma duração muito mais longa do que o normal. Isto seria uma bobagem sem tamanho.

6. Tese Consolidada pelo STJ

Assim, a jurisprudência superior estabeleceu que:

“É cabível agravo de instrumento contra decisões interlocutórias não previstas no rol do art. 1.015 do CPC quando demonstrada a urgência da medida ou quando o julgamento da questão na apelação se revelar inútil.”

Esta orientação reconhece que o formalismo excessivo não pode sobrepor-se à efetividade processual, permitindo maior flexibilidade na análise da admissibilidade recursal.

7. Critérios para Aplicação da Flexibilização

Os tribunais têm exigido demonstração objetiva de:

  • Urgência comprovada: Risco concreto de dano grave, de difícil ou impossível reparação
  • Inutilidade superveniente: Situações onde a análise posterior tornaria o julgamento inócuo
  • Prejuízo irreversível: Consequências que não podem ser adequadamente reparadas ao final

8. Aspectos Procedimentais do Agravo de Instrumento 

Prazo para Interposição

O prazo de 15 dias úteis para interposição do agravo de instrumento conta-se da intimação da decisão agravada. Trata-se de prazo peremptório, cuja inobservância acarreta preclusão temporal definitiva.

Mas para quem está começando ou não é da área do Direito, há um detalhe: o prazo não começa a correr da chamada “disponibilização”, mas da “publicação” da decisão. Ou seja, para o advogado há o aviso de disponibilização no dia 10, segunda-feira, por exemplo, mas a publicação é só no dia seguinte: dia 11, terça-feira. E o primeiro dia do prazo será o dia 12, quarta.

Feito essa ressalva, a contagem obedece às regras gerais do CPC, não se computando os fins de semana e feriados. Antes do Novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor em 2016, os dias de prazo eram corridos. Você pode imaginar que nossa vida não era nada fácil.

Peças Obrigatórias e Instrução Documental

É fácil compreender que o agravo deve ser devidamente instruído com documentação que permita ao tribunal a compreensão integral da controvérsia: Peças essenciais incluem cópia da decisão agravada, certidão de intimação, procuração e demais documentos indispensáveis à análise da matéria.

Contudo, o Novo Código de Processo Civil mudou um pouco as coisas, já que deixa claro que, se o processo for eletrônico (e quase todos os processos o são hoje em dia, com exceção dos mais antigos), não é necessário apresentar as peças obrigatórias, pois podem ser facilmente consultadas no processo que deu origem ao recurso.

Mas fique atento. Se o processo ainda for no papel, a ausência de peças obrigatórias pode determinar o não conhecimento do recurso, prejudicando definitivamente a pretensão recursal e colocando tudo a perder.

Identificação dos Advogados atuantes no processo

Pode parecer algo besta, mas ainda é preciso deixar claro quem são os advogados atuantes no processo principal, pois a falta desta providência tornaria impossível intimar a parte contrária para resposta. Não se esqueça disto!

Pagamento das custas recursais

Finalmente, é preciso pagar as custas do recurso de agravo de instrumento, sob pena de, uma vez recebido o processo sem este pagamento, você ter que pagar esta quantia em dobro! (vide artigo 1.007, §4o do CPC) Esta é outra “colher de chá” do Novo Código de Processo Civil, pois se isso acontecesse durante o reinado do CPC de 1973, seu processo seria considerado deserto – ou seja, iria por água abaixo, sem dó nem piedade.

É claro, se o seu cliente já tem o benefício da gratuidade da Justiça, não será necessário recolher esta taxa. Mas não esqueça de deixar isto claro na petição, indicando o número das folhas ou ID da decisão que concedeu a benesse ao seu cliente.

9. Como funciona o processamento e julgamento do Agravo de Instrumento

Onde o recurso é analisado e como é distribuído

O agravo de instrumento é processado diretamente no Tribunal de Justiça (ou Tribunal Regional Federal, conforme o caso) que seria responsável por julgar uma eventual apelação do processo principal. Após a protocolização, o recurso passa por distribuição eletrônica automática, sendo sorteado para um desembargador que atuará como relator do feito.

A possibilidade de conseguir efeito suspensivo e a decisão liminar

Logo no início da análise, o desembargador relator tem a prerrogativa de conceder efeito suspensivo ao agravo quando identifica dois requisitos essenciais: a probabilidade do direito alegado (fumaça do bom direito) e o perigo de que a demora cause danos graves e irreversíveis à parte (risco de dano irreparável ou de difícil reparação). Essa análise inicial é fundamental porque funciona como uma proteção provisória, garantindo que a pretensão recursal não seja esvaziada enquanto aguarda o julgamento definitivo.

O julgamento final pelo colegiado

Após essa etapa individual nas mãos do relator, o agravo de instrumento é encaminhado para julgamento colegiado pela turma ou câmara especializada correspondente. É nesse momento que o mérito do recurso recebe exame completo e definitivo pelos desembargadores, que decidirão se a decisão recorrida deve ser mantida, reformada ou anulada.

10. Estratégias práticas e dicas importantes

Para quem atua na advocacia

Antes de interpor o recurso, é essencial fazer uma análise cuidadosa sobre a admissibilidade do agravo. Isso significa verificar se a decisão que você pretende recorrer realmente se encaixa em alguma das hipóteses previstas no artigo 1.015 do CPC ou se o caso permite a aplicação da flexibilização estabelecida pelo STJ no Tema 988. Essa checagem prévia evita o risco de ter o recurso não conhecido por inadequação da via eleita.

A qualidade da fundamentação faz toda a diferença, principalmente quando se trata de decisões que não estão expressamente listadas no rol taxativo do artigo 1.015. Nesses casos, é preciso demonstrar de forma clara e objetiva por que aquela situação específica exige uma resposta imediata do tribunal, apresentando elementos concretos que comprovem a urgência e o potencial de dano irreparável. Documentos, provas e precedentes jurisprudenciais que sustentem essa urgência devem ser anexados ao recurso.

Outro ponto crítico é o controle rigoroso dos prazos processuais. Vale a pena investir em sistemas de gestão processual (softwares jurídicos, planilhas detalhadas ou outros mecanismos de controle) que alertem com antecedência sobre os prazos para interposição do agravo, evitando a perda de prazos fatais que podem comprometer irremediavelmente o direito da parte.

Para estudantes e quem está se preparando para concursos

O primeiro passo é dominar bem a sistemática legal do agravo de instrumento, o que significa conhecer a fundo o artigo 1.015 do CPC e entender como os tribunais têm interpretado cada uma de suas hipóteses. Não basta decorar o rol; é preciso compreender a lógica por trás de cada inciso e saber relacioná-los com situações práticas.

Além do conhecimento da lei seca, é fundamental acompanhar a evolução jurisprudencial sobre o tema. Os tribunais superiores, especialmente o STJ e o STF, constantemente analisam questões relacionadas ao cabimento do agravo de instrumento e à interpretação do rol do artigo 1.015. Estar atualizado com essas decisões demonstra preparo e permite identificar tendências e mudanças de entendimento.

Por fim, desenvolva a habilidade de aplicar esse conhecimento teórico em casos concretos. Ao se deparar com uma situação prática – seja em um estudo de caso, em uma prova ou futuramente na advocacia –, você precisa ser capaz de identificar rapidamente se aquela decisão interlocutória é recorrível por agravo de instrumento, qual dispositivo legal fundamenta esse cabimento e quais argumentos jurídicos sustentam a pretensão recursal.

11. Erros Comuns e Como Evitá-los

Falhas Técnicas Frequentes

Perda de prazo: Principal causa de insucesso, exige controle sistemático e redundante.

Instrução inadequada: Ausência de peças essenciais em processos físicos (não eletrônicos) compromete a admissibilidade.

Fundamentação genérica: Argumentação superficial, especialmente nos casos do Tema 988.

Medidas Preventivas

Implementação de rotinas processuais que incluam verificação múltipla de prazos, check-list de documentação e análise criteriosa da fundamentação antes da protocolização.

Aqui está a reescrita da conclusão e do FAQ:

Conclusão: conhecimento técnico aliado à estratégia processual

O agravo de instrumento se tornou uma das ferramentas mais importantes do processo civil brasileiro. Para utilizá-lo bem, não basta apenas conhecer as regras técnicas e os procedimentos – é preciso também ter visão estratégica para avaliar as consequências processuais de cada decisão e entender o momento certo de recorrer.

A abertura promovida pelo STJ por meio do Tema 988 foi um avanço significativo, pois permitiu que mais situações pudessem ser levadas ao conhecimento do tribunal de forma imediata. Por outro lado, essa flexibilização trouxe uma responsabilidade maior para advogados e advogadas: agora é preciso demonstrar de forma convincente e bem fundamentada a real urgência que justifica o recurso imediato, evitando a banalização do instrumento.

Para quem está estudando ou já atuando na área jurídica, dominar bem esse tema representa uma vantagem competitiva importante. O agravo de instrumento aparece constantemente na prática dos tribunais e é presença garantida em provas de concursos públicos, especialmente para carreiras jurídicas. Conhecer seus detalhes e saber aplicá-los adequadamente faz diferença real no dia a dia profissional.

Olhando para frente, a tendência é que o instituto continue evoluindo no sentido de equilibrar dois objetivos fundamentais: garantir que o processo seja efetivo e rápido quando necessário, mas sem comprometer a segurança jurídica e a ordem processual. O agravo de instrumento seguirá sendo peça essencial para corrigir equívocos das decisões judiciais e proteger os direitos das partes ao longo do processo.

12. Perguntas frequentes sobre Agravo de Instrumento

Qual é o prazo para interpor agravo de instrumento?

O prazo é de 15 dias úteis, contados a partir da data em que a decisão recorrida foi publicada ou intimada à parte.

O que estabelece o artigo 1.015 do Código de Processo Civil?

Esse artigo traz uma lista com as hipóteses específicas de decisões interlocutórias que podem ser atacadas por meio de agravo de instrumento. É o chamado “rol de cabimento” do recurso.

É possível interpor agravo de instrumento em situações que não estão no artigo 1.015?

Sim, é possível. Conforme decidido pelo STJ no Tema 988, o agravo também cabe quando houver urgência comprovada ou quando esperar até a apelação tornaria o recurso inútil ou ineficaz. Nesses casos, é fundamental demonstrar de forma clara e objetiva essas circunstâncias.

Quais documentos são obrigatórios ao interpor o agravo de instrumento?

Depende do tipo de processo. Se o processo tramita em papel (físico), é obrigatório juntar cópias da decisão recorrida, da certidão de intimação, da procuração do advogado e das demais peças essenciais para compreender a controvérsia. Já nos processos eletrônicos, não é necessário anexar essas cópias, pois o tribunal tem acesso direto aos autos digitais.

O agravo de instrumento sempre suspende a decisão recorrida?

Não automaticamente. O agravo só terá efeito suspensivo se você solicitar expressamente essa medida no próprio recurso (pedido de tutela recursal ou antecipação de tutela recursal) e se o desembargador relator entender que estão presentes os requisitos legais: probabilidade do seu direito e risco de dano grave caso a decisão continue produzindo efeitos enquanto o recurso é julgado.

Mario SolimeneAuthor posts

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Advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FADUSP - Largo de São Francisco), turma de 1994, com especialização em Direito Privado e Processo Civil. Inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, São Paulo, sob o número 136.987. Pós graduado (Pg.Dip.) e Mestre (MMus) pela University of Manchester e Royal Northern College of Music, Reino Unido (2003-2006). Curso de Extensão em Direitos Humanos Internacionais sob supervisão de Laurence Helfer, J.D, Coursera, School of Law, Duke University, EUA (2015). Inscrito como colaborador da entidade Lawyers Without Borders (Advogados Sem Fronteiras) e membro da International Society of Family Law (Sociedade Internacional de Direito de Família). Tomou parte em projetos internacionais pela defesa da cidadania e Direitos Humanos na Inglaterra, Alemanha, Israel e Territórios da Palestina. Fluente em Inglês, Espanhol, Italiano e Alemão.

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