Advogado militante desde 1980, tomei contato com a Mediação ao participar do curso de Mediação ministrado no Familae, em 1999. Desde então tenho tido a oportunidade de vivenciar a prática de resolução de conflitos com as partes buscando soluções por intermédio dos seus próprios recursos internos.
Até há alguns anos atrás os profissionais de direito viam como única forma de resolução de conflitos a proposição do pedido pelas partes e a atuação do Judiciário por intermédio do Juiz que, interpretando e aplicando a lei, dava razão a uma delas.
Hoje, felizmente, grande parte desses profissionais está consciente da necessidade de trabalhar as questões subjetivas das partes em conflito, as causas reais encobertas pelo pedido objetivo.
No lugar de Mediador posso compreender o quanto a Psicologia pode contribuir nesse sentido. As abordagens interdisciplinares, que se iniciaram com a intervenção do psicólogo no processo judicial – sem esquecer as assistentes sociais, que são anteriores -, na qualidade de perito, hoje é uma realidade, havendo casos em que o próprio juiz encaminha as partes para terapia de família, suspendendo o andamento do processo.
A partir da década de 60, quando se iniciou com mais intensidade a liberalização dos costumes, passou o Direito, paulatinamente, a acompanhar essa evolução da sociedade.
Porém, apenas em dezembro de 1.977, com a instituição do divórcio, é que se obteve algum avanço no sentido de acompanhar a evolução da família, que já era evidente no resto do mundo.
Em outubro de 1988, outro grande passo ainda mais significativo, com promulgação da Constituição Federal, que reduziu a distância existente entre a ordem legal e a realidade social, provocando uma verdadeira revolução no Direito de Família. Todavia, apesar de contar agora com um aparato legal aplicável às relações familiares mais próximo da realidade social experimentada por praticamente todo o mundo ocidental, ou justamente por isso, o Direito de Família mostra-se como o ramo do direito mais afeito à buscar recursos interdisciplinares.
Dessa forma já é possível encontrarmos normas legais ou decisões judiciais que reconhecem: a desbiologização da paternidade, admitindo a possibilidade de um indivíduo ocupar o lugar de pai afetivo, desconsiderando o caráter biológico; a guarda compartilhada, onde o casal separado divide a guarda dos filhos; o declínio do patriarcalismo e suas consequências como a perda do lugar do homem como figura central da família, o que, porém, não implica em desprestígio da figura paterna; a existência de diversas formas de constituição de família, além do casamento tradicional, havendo, inclusive, um projeto de lei que disciplina as uniões homossexuais em trâmite junto ao Congresso Nacional.
Tudo isso demonstra a necessidade do Direito voltar-se mais para questões subjetivas, pois os conflitos familiares que envolvem ação de separação ou divórcio litigioso, pensão alimentícia, regulamentação de visitas, etc., requerem mais do que os profissionais de Direito têm, normalmente, condições de oferecer, em razão da forte carga emocional que acompanham esses conflitos.
As Varas de Família, onde correm esses processos, contam com a assistência de Psicólogos e Assistentes Sociais, que atuam como peritos dos Juizes. Estes por sua vez, conforme temos notícia, têm se valido, paralelamente, do encaminhamento das partes em conflito para a Terapia ou a Mediação Familiar, pois a atuação de seus peritos, por tratar-se de uma imposição, pode impedir o estabelecimento de uma relação espontânea comprometendo o resultado do trabalho.
Assim, o advogado familiarista, dada a peculiaridade da sua área de atuação, difere profundamente dos profissionais que atuam em outras áreas do Direito.
Esse profissional deve estar ciente de que ao procurá-lo o cliente pode estar debilitado emocionalmente, ansioso, cabendo ao advogado orientá-lo de forma a evitar qualquer atitude precipitada, e, constatando a ausência de riscos para o seu cliente, deve despir-se de qualquer espírito beligerante procurando uma solução conciliatória juntamente com o advogado da parte contrária. Valendo-se também, de acordo com as circunstâncias, da intervenção de um Terapeuta Familiar.
Os conflitos emocionais no Direito de Família são intensos e um trabalho interdisciplinar preventivo pode evitar o desgaste emocional e financeiro de um processo judicial litigioso, pois os operadores de Direito devem considerar as motivações psíquicas de um dado comportamento das partes envolvidas.
Por outro lado, a fim de atender à essas demandas, a Psicologia viu-se obrigada a ampliar o seu campo de atuação do intrapsíquico para o interpsíquico, buscando estudar, além do mundo interno do homem suas relações com outras pessoas. Essas relações são reguladas por normas jurídicas, exigindo do profissional de Psicologia alguns conhecimentos jurídicos básicos para tratar adequadamente essas questões.
É comum hoje em dia o Terapeuta de Família deparar-se com a afirmação de um dos cônjuges que, por exemplo, reluta em aceitar a separação como solução para o estado de crise vivenciado pelo casal, que na hipótese de separação irá pedir pensão alimentícia, ou que contratará os melhores advogados para que fique com a guarda das crianças.
Essas questões, aparentemente objetivas com as quais o Direito lidaria com relativa facilidade, encobrem as razões subjetivas, determinantes do divórcio emocional, cabendo assim aos advogados e ao juiz, não só na ação de divórcio, mas em todos os conflitos familiares, separar o aspecto emocional para chegar às verdadeiras razões do litígio, em outras palavras, desconstruir o litígio.
O que é legal nem sempre é justo, e conscientes disso vários profissionais de Direito têm se batido para perseguir a Justiça, às vezes até em detrimento da própria lei. Para tanto há necessidade de, através da multidisciplinaridade, agregar todo o conhecimento que encontra-se disperso nas várias ciências que podem contribuir para desvendar a questão jurídica no âmbito do Direito de Família.
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